Texto 1 Ser leve e líquido (Zygmunt Bauman) A elite global contemporânea é formada no padrão do velho estilo dos “senhores ausentes”. Ela po...
Texto 1
Ser leve e líquido
(Zygmunt Bauman)
A elite global contemporânea é formada no padrão do velho estilo dos “senhores ausentes”. Ela pode dominar sem se ocupar com a administração, gerenciamento, bem-estar, ou, ainda, com a missão de “levar a luz”, “reformar os modos”, elevar moralmente, “civilizar” e com cruzadas culturais. O engajamento ativo na vida das populações subordinadas não é mais necessário (ao contrário, é fortemente evitado como desnecessariamente custoso e ineficaz) — e, portanto, o “maior” não só não é mais o “melhor”, mas carece de significado racional. Agora é o menor, mais leve e mais portátil que significa melhoria e “progresso”. Mover-se leve, e não mais aferrar-se a coisas vistas como atraentes por sua confiabilidade e solidez — isto é, por seu peso, substancialidade e capacidade de resistência — é hoje recurso de poder.
Fixar-se ao solo não é tão importante se o solo pode ser alcançado e abandonado à vontade, imediatamente ou em pouquíssimo tempo. Por outro lado, fixar-se muito fortemente, sobrecarregando os laços com compromissos mutuamente vinculantes, pode ser positivamente prejudicial, dadas as novas oportunidades que surgem em outros lugares. Rockefeller pode ter desejado construir suas fábricas, estradas de ferro e torres de petróleo altas e volumosas e ser dono delas por um longo tempo (pela eternidade, se medirmos o tempo pela duração da própria vida ou pela da família).
Bill Gates, no entanto, não sente remorsos quando abandona posses de que se orgulhava ontem; é a velocidade atordoante da circulação, da reciclagem, do envelhecimento, do entulho e da substituição que traz lucro hoje — não a durabilidade e confiabilidade do produto. Numa notável reversão da tradição milenar, são os grandes e poderosos que evitam o durável e desejam o transitório, enquanto os da base da pirâmide — contra todas as chances — lutam desesperadamente para fazer suas frágeis, mesquinhas e transitórias posses durarem mais tempo. Os dois se encontram hoje em dia principalmente nos lados opostos dos balcões das mega-liquidações ou de vendas de carros usados.
A desintegração da rede social, a derrocada das agências efetivas de ação coletiva, é recebida muitas vezes com grande ansiedade e lamentada como “efeito colateral” não previsto da nova leveza e fluidez do poder cada vez mais móvel, escorregadio, evasivo e fugitivo. Mas a desintegração social é tanto uma condição quanto um resultado da nova técnica do poder, que tem como ferramentas principais o desengajamento e a arte da fuga. Para que o poder tenha liberdade de fluir, o mundo deve estar livre de cercas, barreiras, fronteiras fortificadas e barricadas. Qualquer rede densa de laços sociais, e em particular uma que esteja territorialmente enraizada, é um obstáculo a ser eliminado. Os poderes globais se inclinam a desmantelar tais redes em proveito de sua contínua e crescente fluidez, principal fonte de sua força e garantia de sua invencibilidade. E são esse derrocar, a fragilidade, o quebradiço, o imediato dos laços e redes humanos que permitem que esses poderes operem.
Se essas tendências entrelaçadas se desenvolvessem sem freios, homens e mulheres seriam reformulados no padrão da toupeira eletrônica, essa orgulhosa invenção dos tempos pioneiros da cibernética imediatamente aclamada como arauto do porvir: um plugue em castores atarantados na desesperada busca de tomadas a que seligar. Mas no futuro anunciado pelos telefones celulares, as tomadas serão provavelmente declaradas obsoletas e de mau gosto, e passarão a ser fornecidas em quantidades cada vez menores e com qualidade cada vez mais duvidosa. No momento, muitos fornecedores de eletricidade exaltam as vantagens da conexão a suas respectivas redes e disputam os favores dos que procuram por tomadas.
Mas a longo prazo (o que quer que “longo prazo” signifique na era da instantaneidade) as tomadas serão provavelmente banidas e suplantadas por baterias descartáveis compradas individualmente nas lojas e em oferta em cada quiosque de aeroporto e posto de gasolina ao longo das estradas.Essa parece ser a distopia feita sob medida para a modernidade líquida.
BAUMAN, Zygmunt. Ser leve e líquido. In: BAUMAN,
Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien.
São Paulo: Zahar, 2008. p. 17-18.
UECE 2022.2 - QUESTÃO 01
A partir do texto 1, pode-se apontar as transformações ocorridas no mundo contemporâneo, principalmente, no tocante às relações entre os poderes globais que tendem a fragilizar as redes de ações coletivas.
O propósito dessa reorganização é
A) apresentar, em razão da lógica do consumo, a contínua e crescente fluidez do laço entre pessoas e instituições.
B) fornecer poderes a um grupo de interesse de senhores, desmerecendo outras gerações.
C) construir instituições sólidas que valorizam as opiniões de todos independente da personalidade de cada um.
D) causar conflitos cibernéticos para o privilégio de uma geração de internautas participantes das conexões.
GABARITO:
A) apresentar, em razão da lógica do consumo, a contínua e crescente fluidez do laço entre pessoas e instituições.
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