O incêndio que atingiu o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, não provocou piores danos - excetuando
ENADE 2017 - QUESTÃO 22
A luz da nossa língua
O incêndio que atingiu o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, não provocou piores danos - excetuando a perda, sempre irreparável, de uma vida humana — pela simples razão de aquilo que nele se mostrava ser resistente ao fogo. A língua portuguesa é patrimônio imaterial. Não há incêndio capaz de a devorar, a não ser o da ignorância.
Compreender como se formou e afirmou a língua que falamos, conhecer as diferentes variantes do português, ajuda-nos a perceber melhor a história do mundo e — acredito - pode tornar-nos um pouco mais abertos ao outro. O pensamento xenófobo e racista que volta e meia aflora, como uma doença repugnante, em certas franjas das sociedades brasileira e portuguesa, é, em larga medida, uma expressão da ignorância da história da língua que nos deu origem.
Acredito que existe hoje um maior conhecimento mútuo das diferentes variantes da língua portuguesa, desde logo porque as novas tecnologias tendem a derrubar fronteiras. Persiste, mesmo assim, muita ignorância. Recordo certa ocasião, há alguns anos, quando, em viagem pelo interior de Pernambuco, parei junto a um pequeno bar para pedir informações. O rapaz que me recebeu não compreendeu o meu sotaque. Repeti a mesma questão uma e outra vez, sem qualquer sucesso. Tentei de novo, mas dessa vez com o meu melhor sotaque pernambucano. O rosto do rapaz iluminou-se: “Moço, se você fala português, por que estava falando comigo em estrangeiro?”.
Numa outra ocasião, no Rio, um taxista, estranhando o meu sotaque, quis saber de onde eu vinha. “Angola?! E em que estado fica isso?” Quando lhe expliquei que Angola é um país, na costa ocidental de África, fez questão de me parabenizar pela qualidade do meu português. Disse-lhe que em Angola também falamos português: “Jura?!” — retorquiu. — “Pensei que só no Brasil se falasse português”.
Se nós criamos as línguas, as línguas também nos criam a nós. Não é a mesma coisa crescer falando português, tupi ou swahili. Um dos meus sobrinhos, Samuel, nasceu e cresceu em Luxemburgo, filho de pai luxemburguês. Aprendeu a falar português com a mãe e luxemburguês e alemão com o pai. Como os pais falavam um com o outro em francês, domina também essa língua desde o berço. Sempre que muda do português para o alemão, e deste para o francês ou o luxemburguês, há alguma coisa em Samuel, um sutil aspeto da personalidade, que parece se alterar também. É como se coexistissem dentro dele várias pessoas, cada uma se exprimindo num idioma diferente.
Em Cabo Verde, o bilinguismo é uma situação vulgar. As pessoas falam naturalmente duas línguas maternas, o português e o crioulo. Fascina-me a forma como os cabo verdianos cultos trocam de língua, enquanto conversam, dependendo do tema e do interlocutor. Ao mudarem do crioulo para o português, verifica-se também uma ligeira mudança de personalidade. Um cabo-verdiano ao falar português torna- se um tudo nada mais formal. Não por acaso, a esmagadora maioria da riquíssima música cabo-verdiana usa o crioulo, ao passo que a língua portuguesa reina quase isolada na literatura.
AGUALUSA, 1. E. A luz da nossa lingua. n: O Globo, 28 dez. 2015 (adaptado).
Das passagens a seguir, retiradas do texto aquela cujo conteúdo é apropriado para exemplificar a definição de língua como forma (“lugar”) de interação é
A) “A língua portuguesa é patrimônio imaterial. Não há incêndio capaz de a devorar, a não ser o da ignorância."(1ºparágrafo)
B) “..conhecer as diferentes variantes do português [...] - acredito — pode tornar-nos um pouco mais abertos ao outro.” (2º parágrafo)
C) “O pensamento xenófobo e racista que volta e meia aflora (...) é, em larga medida, uma expressão da ignorância da história da língua que nos deu origem."(2º parágrafo)
D) “Se nós criamos as línguas, as línguas também nos criam.” (5º parágrafo)
E) “Em Cabo Verde, o bilinguismo é uma situação vulgar.” (6º parágrafo)
QUESTÃO ANTERIOR:
GABARITO:
B) “..conhecer as diferentes variantes do português [...] - acredito — pode tornar-nos um pouco mais abertos ao outro.” (2º parágrafo)
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